


MP. 757
Wanda Hanke, Dourados/MS, "Chefe Caiuás da Aldeia Farinha Seca. Dourados", s.d.
Wanda Hanke, Dourados/MS, "Chefe Caiuás da Aldeia Farinha Seca. Dourados", s.d.
Relato de
Elias Fernandes Cordeiro
XETÁ
Transcrição em Português
Elias Fernando Cordeiro: É, eu estava olhando mesmo essas fotos que são muito interessantes, até pela arquitetura dela, né? Ali eu consigo aqui até eu, quando fui criança até os 15, por aí, né? Na minha adolescência eu cheguei a morar dentro dessas casinhas aí, ó, do jeito que você está vendo aí, é típico guarani mesmo, tá. Ali dá pra ver que é tudo essas madeiras, até a cobertura é muito interessante. A cobertura ali eu não consigo, assim, te dar um detalhe, mas eu tô achando que é de capim ela foi coberta de capim, né? E ela foi toda rodeada de madeira que a gente... agora a gente fala pau a pique, né? Para essas construções, assim.
Então ali é... o povo indígena, de uma maneira, né ele só tira o necessário da Mata para estar construir né suas casas né então aqui é bem interessante essa construção aqui é o típico Guarani mesmo.
Brunno Douat: Como que você chamaria essa casa Elias em Guarani tem algum termo específico para esse tipo de construção
Elias Fernando Cordeiro: Olha para essas nossas casas Guarani a gente tem uma gente chama na nossa língua mesmo é óga né. Consegue repetir comigo aí, óga?
Brunno Douat: Óga
Elias Fernando Cordeiro: Olha Óga é casa tá esse é o nome que a gente dá para ela né à é que tem uma outra palavra também que a gente usa né que é opy já é uma casa onde o pessoal se reúne para fazer as rezas deles né então essa já uma casa específica para outra coisa, mas para casa assim para morada mesmo se chama óga é casa
Brunno Douat: Maravilha e você se lembra assim como é que era o processo de construir essas casas você viu os seus familiares assim, as pessoas mais velhas construírem essa casa como você era criança era uma coisa que tinha frequência que durava muito, como que era o processo de construir e habitar essa casa?
Elias Fernando Cordeiro: Olha, assim para construir ela assim, ela era rápido né ,era questão aí de uns dois dias assim, por causa que para essa construção assim, só usa madeira mesmo né, vou mostrar na foto ali, então a madeira assim, geralmente é tirado do redor mesmo, onde vai ser construído, e por exemplo, vai ser construído tal lugar ele a gente já escolhi o lugar onde tem bastante madeira para não tá indo muito longe buscar então é sempre retirado ao redor mesmo por esta construção é bem rápida, e a durabilidade dela também né assim as até ela dura bastante, só cobertura que ela não dura muito é questão de um ano dois anos no máximo, e esse capim ele vai secando, né, quando ele tá verde, ele vai secando, e apesar de ir pegando muita chuva, ele vai apodrecendo a cobertura. Então a cobertura tem que ser trocada talvez a cada um ano, dois anos, depende o local, se tem muita chuva, né, porque a chuva, na verdade, o que estraga mais é a chuva mesmo, não tanto o sol, né, e eu já ajudei muitas vezes a construir esse tipo de casinha, porque quando eu morava lá na minha aldeia, né, de origem mesmo, lá, então, lá a gente morava bastante nessas casinhas mesmo, assim, simples, bem assim, construída assim, dessa maneira que você está olhando na foto mesmo.
Brunno Douat: E você se lembra de ter mudado muito de casa? Você lembra que era uma coisa assim, que você estava sempre se mudando, ou você lembra de uma, a estrutura da parede, a cobertura vocês mudavam com frequência, né, para preservar, mas as paredes, assim, você lembra de você se mudar para várias casas diferentes, ou a estrutura da casa, das paredes da sua infância foi sempre a mesma estrutura, assim, a mesma casa?
Elias Fernando Cordeiro: É, é porque a gente, né, o povo guaranis, pelas histórias que eu sei, porque eu também vivi, o povo guaranis, ele não tinha uma morada fixa, agora, assim, até agora, nos tempos de hoje, assim, os guaranis, assim, é dificilmente eles viver num lugar, numa aldeia mesmo, porque eles, no tempo antigo, eles eram muito nômades, que a gente fala, né, ele não tinha um lugar fixo, uma morada fixa, então ele chegava num lugar, ele construía uma casinha igual você está vendo aí, ficava uma temporada, assim, tipo, numa época de que tinha muita fruta, ou muita caça, eles costumavam ficar nessas regiões, assim, de muita fruta, muita caça, que é onde tinha rios, que tinha muito peixe, então eles ficavam um tempo num lugar e quando ia acabando, por exemplo, as frutas, a caça, iam, né, quase se terminando, eles se mudavam pra outra região e a estrutura da casa ficava, né, então eles, eles andavam assim, de lugar em lugar, de cidade em cidade, né, porque eles viajavam muito e eles construíam uma casa assim e deixavam, igual eu falei, e daqui, por exemplo, vamos supor que hoje eles estavam num lugar e daqui um mês eles estão em outro lugar, então eles faziam, tipo, eles estavam um mês, agora eles estão em setembro, daqui, no outro ano, no outro mês de setembro, eles voltavam pro mesmo lugar de novo, sabe? Então, é, o povo guarani, ele era assim, ele não tinha um lugar fixo, uma morada fixa.
Brunno Douat: Maravilha.
E a sua memória, Elias, da parte interna, assim, da parte de dentro dessa casa, como que ela era? Ela tinha divisões, tinha telas, assim, que dividiam o lugar onde certas pessoas da família dormiam? Como é que era o lugar onde as pessoas dormiam? Tinha uma fogueira interna, onde que ela ficava? Como é que você poderia descrever, assim, o que acontecia dentro dessa casa, o que que tinha dentro dessa casa?
Elias Fernando Cordeiro: Olha, a casa, ela era, ela era sem divisórias, sabe? Então, ela era uma fogueira, né, ela era no meio da casa, né, ela era feita no meio da casa, e ela não tinha divisórias. Então, eu, assim, eu tenho lembranças do meu finado do vô, né, quando eu era criança, eu morei um tempo com ele, né, e ele era bem, ele era bem, a gente fala, ele era bem daquelas pessoas bem antigas mesmo, né, e então, assim, a cama, assim, que eu lembro, ela era cama no chão mesmo, sabe? A gente cortava capim ou folha de palmeira pra gente estar forrando, sabe? E prateleira a gente fazia, fazia de madeira mesmo, assim, pra estar guardando o alimento, sabe? Pra proteger da umidade do chão, tinha que fazer prateleiras, né, dentro da casa mesmo, e então não tinha, não tinha divisórias, não tinha quarto, não tinha sala, não tinha cozinha, nada, né? Como hoje a gente vive já mais moderno, hoje a gente tem, né.
Mas nesse tempo mais antigo, a gente não tinha isso, não. A gente, até pra dormir, né, tinha uma caminha separada do meu avô e nós, que era criança, tinha o nosso canto também, né? E a gente sempre dormia em volta da fogueira mesmo, ainda mais quando era frio, era inverno, né? A gente fazia uma fogueira grande dentro, assim, à noite, pra poder pra poder se aquecer.
Brunno Douat: E você, vocês usavam a cobertura, alguma estrutura na cobertura pra pendurar alguma coisa? Ou vocês usavam mais uma estrutura pra pendurar? Ou mais as prateleiras? Vocês penduravam alguma coisa na cobertura, no teto da casa?
Elias Fernando Cordeiro: Assim, a gente usava, assim, mas pra erguer, tipo assim, a gente tinha as cobertas, né, pra não deixar no chão, a gente tinha que fazer, tipo, um pedaço de madeira, a gente fazia, tipo um pedaço de madeira, um gancho mesmo e pendurava, assim, no teto e erguia as cobertas de cima, né? Pra não ficar diretamente só no chão, pra não deixar sempre, né, no chão. E a gente usava assim, como guarda-roupa também, pra guardar as roupas da gente também, tinha que guardar elas, né, pendurado.

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