MP.KO.7505
Vladimir Kozak, Serra dos Dourados/PR, s.d.

Relato de
CLAUDEMIR DA SILVA E DIVAL DA SILVA
 XETÁ





Transcrição em Português



Claudemir da Silva Xetá: Essa aqui é mais uma família. Não sei se foi o doutor Loureiro ou o Kozák que tirou essa foto com eles. Nessa época já tinham expulsado o povo Xetá, já tinham consumido com a maioria deles. Ele ainda conseguiu achar essa família e pediu para o Herarekã pra reunir um pouco de gente pra ele fazer essa foto. Meu pai falava muito dessa foto. Na verdade, o Herarekã era tio do tio Tuca. É o relato que eles passaram para a Carmen Silva, a antropóloga que fez o trabalho com eles. O resto já tava correndo, um pouco já tinha consumido, e ele ainda conseguiu alcançar essa família pra fazer essa foto. Pode ver que eles estão reunidos olhando pra fazer a fotografia.

Josi: Quantas pessoas, mais ou menos, moravam nesses grupos, nesses bandos, assim, no meio do mato?

Claudemir da Silva Xetá: É até meio chato falar disso, mas antes do massacre eles eram em 2600 indígenas, e daí depois desse massacre ficou essa familinha, que está nessa foto aqui, e depois conseguiram chegar no grupo do Iengue e do Tumã, que é meu avô. Foram os últimos que eles conseguiram tirar de lá e levaram. Uma coisa chata, eu nem gosto de falar sobre isso, mas a gente é obrigado a falar. Meu pai e o tio Tuca falavam que quando eles chegaram pra pegar os índios era igual cachorro, sabe, quando uma cadela cria e as pessoas chegam e acham bonito os cachorrinhos? "Esse cachorrinho eu vou levar." Com o nosso povo não foi diferente. Eram os termos que os nossos líderes usavam. Até hoje eles falam que foi saído um caminhão lotadinho de indígenas e até hoje ninguém sabe pra onde foi, aonde estão, e o que aconteceu. Até hoje não temos essa resposta. Aí sobrou só essa família dessa foto do Herarekã, do Tumã e do Iengue. Na época, o João Serrano, que tomava conta dos indígenas na época do SPI, levou meu pai, meu avô e meu tio ali pro Pinhalzinho. Desde essa vez, demorou 40 anos. Eles sabiam da existência uns dos outros, mas foram poder se encontrar depois de 45 anos. O primeiro encontro do povo Xetá foi aqui na terra indígena de São Jerônimo da Serra em 1994, depois de 45 anos. Hoje pra gente é uma história, mas para o nosso povo foi uma realidade que eles passaram. Mataram muito indígena, com tiro, envenenamento, várias coisas bem chatas. A gente nem gosta de ficar tocando muito, mas como a gente tá no trabalho a gente tem que relatar a coisa certa. E essa foto é um símbolo dessa tragédia que aconteceu com o nosso povo.

Josi: Essa foto aqui já mostra o povo reduzido, né? O povo todo separado, em pequenos grupos, no meio do mato.

Brunno Douat: Uma foto bem construída, no fim das contas, que parece uma foto natural, mas é totalmente construída, né?

Claudemir da Silva Xetá: É verdade. Pra gente é uma marca muito triste, né? Como eu falei, a gente fala e mexe porque a gente tem que fazer isso mesmo, mas pra gente, pra nós mesmo, é uma tristeza muito grande, sabe? Mexe lá numa ferida, lá no fundo, você entendeu? Mas...Não leva essa...Não leva em consideração a questão dos desabafo da gente. Pode fazer mais pergunta.

Brunno Douat: É, claro. Eu acho que, assim, a questão dessa foto era realmente a questão da quantidade de pessoas embaixo da cobertura, entender o que eram, se essa cobertura era alguma coisa mais coletiva ou não. Mas acho que o teu esclarecimento foi totalmente pertinente, Claudemir, demonstrar que provavelmente eram, então, uma casa individual de alguma família e toda essa quantidade de pessoas foi uma construção colocada ali pra essa foto.
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