A Dimensão Imaterial do Habitar e Construir Indígenas



interlocutores

Os sujeitos detentores dos saberes sobre essas representações imagéticas, colaboradores diretos do projeto, foram pessoas com diferentes graus de proximidade com o MUPA, o que significa dizer que têm diferentes modalidades de relações com os acervos que este museu preserva. No entanto, comum a todos os colaboradores, é o fato de estarem, pela primeira vez, parando para pensar a respeito dos aspectos construtivos e de habitação desses espaços.

Um dos antropólogos do projeto e também um dos entrevistados, Florêncio Rekayg Fernandes, é Kanhgág da Terra indígena Rio das Cobras, no sudoeste do Paraná, e já vinha de uma série de encontros e inclusive colaborações com o MUPA, como o Curso de Introdução à Língua e à Cultura Kanhgág, por ele ministrado, em 2019. Florêncio também abriu um braço importante do projeto ao mediar entrevistas com anciãos Kanhgág que tinham muitas histórias a propósito das imagens, como a artesã e curadora natural, Judite Sygso Fernandes, e o kujá, benzedeiro e artesão Antonio Sorá Felipe.

Os Xetá, representados pelos caciques e irmãos Dival e Claudemir da Silva da Terra Indígena São Jerônimo, tem uma ligação profunda, inviolável e antiga com estas fotografias e outros acervos, porque heranças diretas de seus antepassados e também documentos jurídicos que atestam a sua história e a sua existência. De um trágico genocídio perpetrado sobretudo nos anos 1950 no noroeste do Paraná, sobreviveram apenas oito indivíduos Xetá. Um deles, Tikuein, pai dos nossos interlocutores, foi uma referência desse povo pelo direito de existirem e de serem reconhecidos, e nesse sentido, de poderem acessar direitos sociais e culturais básicos. Dival e Claudemir cresceram em meio a essas batalhas e nelas fizeram também suas moradas, desde antes do falecimento de Tikuein. Infelizmente, a morosidade no processo judicial de conquista de uma terra que possam chamar de sua é um punhal cravado no peito Xetá que vai se estendendo a gerações. A relação com o acervo, portanto, além de afetiva, é uma forma de defesa da sua própria vida e da reprodução enquanto grupo.

Elias Fernandes Cordeiro é professor da língua Guarani na Aldeia Urbana Kakané Porã em Curitiba. Ele é um entusiasta dos assuntos da cultura e da vivência de seu povo. Seus avós sempre viveram na mata, na vida tradicional das aldeias, e lhes contaram muitas histórias. Como não sabiam escrever nem ler, porque sua cultura não operava dessa maneira, as histórias eram contadas de geração a geração. E foi nesse sentido que